quinta-feira, agosto 03, 2017

A desventura de andar toda a gente a falar do Boaventura outra vez



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Muito nosso. Muito cá de casa. Por vezes conhecemos as coisas ou as pessoas e esquecemo-nos que elas existem. Mas eis que qualquer coisa nos agita a memória e despoleta o fulminante… e é um rosário de comentários, análises, opiniões e, até, descobertas sobre a natureza das tais coisas ou pessoas que há muito conhecemos, mas jazem dormentes no cérebro, pela modulação sináptica que nos remete a memória de curto prazo para a memória de longo prazo. Por outras palavras. O sicrano é arquivado, com displicência, no “arquivo morto” de cada qual.

É o caso, agora, de Boaventura. De repente, o homem escreve uma série de disparates sobre a Venezuela e aqui d’el-rei que a torrente atropela os rápidos do leito do rio da inteligência de cada um de nós e a cada hora, a cada post, a cada comentário, achamos que o homem é uma besta quadrada, roído por ódios à liberdade e à democracia e amante intenso das ditaduras do proletariado (uma espécie de gente a que ele, graças a Deus, escapou pela sua rara inteligência).

Por mim, de há muito que me apercebera que a criatura não é uma variedade recomendável da minha espécie, se quisermos pôr isto em termos de taxonomia plana. As barbaridades e imbecilidades que lhe ouvi durante anos seguidos, sem embargo da sua reputação cultural e académica, foram suficientes para que me fosse esquecendo dele aos bocadinhos. Não seria agora, por via da tragédia em curso na Venezuela que voltaria a falar do beltrano. E mesmo este modesto desabafo, se virem bem, não tem a ver com o magano. Tem a ver com a quantidade de gente que não se cansa de andar a falar nele outra vez. O que ele, sorridente, agradece.


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