quarta-feira, julho 29, 2015

Para desenjoar (2). Ou a história curta de um alarme de incêndio demasiado competente


[5269]

Jantar temporão num salão às moscas de um hotel de 4 estrelas em Maputo. Era preciso jantar cedo, para dormir cedo, pra acordar ainda mais cedo na manhã seguinte para apanhar o avião para Lisboa.

Apenas quatro mastigantes na sala partilhavam um ambiente misto de calma e conforto. De repente, o inferno. Entre dois camarões grelhados, um silvo agudo exactamente por cima de mim, uma vibração como nunca sentira na minha vida, estremecem-me as meninges, as orelhas, o couro cabeludo, o corpo todo. Eu nunca sentira tal violência de som antes, não sabia, assim, exactamente, do que se tratava. Com a pele a vibrar, e protegendo as orelhas com as mãos, deixei os camarões e corri para a entrada. Como de resto, os outros três clientes. Em correria e com o olhar gazeado de quem admite até estar perante uma nova modalidade de acto terrorista.

À porta deparo com o chefe de mesa, sorridente, dizendo para termos calma. Era apenas o alarme de incêndio.

- Mas não há incêndio? Perguntei eu, gritando ao ouvido do sorridente chefe de mesa, já que o silvo continuava.

- Não. Não tem incêndio. Só que tem este alarme que é muito competente. Problema é que é competente demais e começa a apitar sem razão (estou a tentar ser literal).

- Mas como assim? Competente?

- Sim. Cada vez que uma pessoa pede bife na pedra, o bife faz fumo porque a pedra está quente. E o alarme começa o barulho. E aquele senhor ali esta a comer o bife na pedra (o comedor de bifes na pedra era um fulano de expressão inglesa a quem expliquei o que se passava, entenda-se, a culpa era dele porque tinha encomendado um bife ne pedra). Insisti:

- Mas porque é que aceitam encomendas ou põem bife na pedra no menu se sabem que o alarme dispara?

- Não tem problema, porque já cortámos a água. É só o barulho, a água de apagar não sai.

Uma lógica irrefutável que me garante que de cada vez que alguém pedir um bife na pedra naquele hotel e a geringonça disparar, pelo menos não me molho. Posso ficar com os ouvidos a zumbir durante duas horas, posso até, quem sabe… ter um ataque de coração, mas pelo menos não me molho.

Deixei os camarões e fui-me deitar.

*
*

Etiquetas: ,

1 Comments:

At 11:06 da tarde, Blogger MargaridaCF disse...

lol

 

Enviar um comentário

<< Home