quarta-feira, janeiro 05, 2011

Malangatana




[4011]

Conheci Malangatana Valente em 1980, em casa de um amigo comum, em Maputo. Nunca tinha ouvido falar dele mas um dia vi alguns dos seus quadros e impressionou-me o «sentimento» que cada um deles exalava… não sei dizer isto doutra maneira, n
ão sou crítico de arte, pelo que a expressão que mais facilmente me ocorre é exactamente esta. Um sentimento – fosse ele qual fosse, eu não saberia defini-lo bem, embora houvesse já na altura «peritos» na matéria que se desdobravam em críticas a este grande artista moçambicano. Que era muito bom, que era vulgar, que era monocórdico, que só pintava ao ritmo da revolução. Ou da desgraça, da fome e do sofrimento. Que plagiava Picasso, sendo evidentes os traços do mestre espanhol nos seus quadros. Eu ouvia e calava. Porque não achava nada daquilo. Achava apenas que os quadros tinham um sentimento muito forte, o tal «sentimento», para além de uma evidente harmonia cromática, se me quiser aventurar um pouco mais em terrenos que não domino (alô Filipa, help!). Mais tarde, quando o conheci pessoalmente achei que eu tinha alguma razão. Porque Malangatana era verdadeiramente um sentimental. A pintar, a falar, a «estar». Mesmo num período crítico de reminiscências da memória moçambicana relativamente à época colonialista, sempre vi nele (sempre, porque o encontrei mais vezes) um posicionamento muito, mas muito acima da crítica fácil e conveniente ao colonialismo português. Ainda que o criticasse. Frequentemente em quadros que pintou. Mas Malangatana, sem instrução (hoje é doutor honoris causa pela Universidade de Évora), sabia imprimir uma grande elevação a tudo o que dizia. Como, afinal, aos seus quadros. Só assim se explica como uma modesta figura moçambicana (chegou a ser «mainato») se tornou um artista internacionalmente conhecido e presente num grande número de museus e galerias de arte internacional.

Agora, morreu. Em Matosinhos. Mas deixou obra e muitos portugueses partilham um genuíno orgulho nela. Vá-se lá perceber porquê.

.

Etiquetas: ,

6 Comments:

At 2:18 da tarde, Anonymous Rita disse...

Admiração e respeito por esse grande artista cruzei me com ele no CC Franco Moçambicano, em Maputo e sou portuguesa. Espero que a admiração por ele possa ser considerado uma coisa boa, os grandes artistas são do Mundo inteiro e não só de uma nacionalidade! São Grandes! Que Malangatana e a sua obra permaneça na memória do Mundo! Bem haja!

 
At 2:58 da tarde, Anonymous Fausia V. disse...

Sou moçambicana mas agora vivo em Portugal há uns anos a esta parte. Ao princípio os quadros de Malangatana pareciam ser quase sempre a mesma coisa, mas depois comecei mesmo a apreciar a beleza e o significado.
Que ele descanse em paz porque deixou uma grande obra

 
At 11:41 da tarde, Blogger Carlos Araujo disse...

Moçambique perdeu uma das suas referências artísticas. Para mim Malangatana era 'guerra', 'sofrimento', 'angústia' e 'revolta' o que não é de todo inconcebível tendo em conta o seu percurso de vida. Aquela terra é mais Naguib ou Agostinho Mutemba. É com a imagem destes dois últimos que recordo os seus encantos.

 
At 7:20 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Rita

Concordo consigo, Rita

 
At 7:21 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Fausia V.

Deixou sem dúvida, Fausia

 
At 7:22 da manhã, Blogger Nelson Reprezas disse...

Carlos Araujo

Não tenho dificuldade em entender o que dizes, embora não conheça bem a obra de Mutemba

 

Enviar um comentário

<< Home