sexta-feira, abril 22, 2005

Duzentos Metros e Normas de Procedimento



[328] - Acordei com uma notícia reconfortante:

- Para que «póssamos» (este ministro de agricultura é um lídimo sucessor de Jorge Coelho nos pontapés na gramática...) viver em segurança, o governo decreta que as plantações de culturas transgénicas terão de se situar pelo menos a duzentos metros das «culturas normais».

Esta notícia, na sua singeleza, encerra tanto de idiota como de propaganda pueril da bondade e vigilância do governo que temos. Porque:

1) Se os produtos transgénicos fossem tão sinistros como o teor da medida governamental e o tom do apresentador de serviço pretendem fazer crer, não se entende porque é que as culturas têm de estar arredadas das culturas normais. Deveriam ser proibidas, ponto final;

2) Se a distância dos duzentos metros pretende preservar os riscos de polinização expontânea (o que, na verdade, é um facto), apetece perguntar porquê duzentos metros e não dois quilómetros – ou mesmo vinte. Era bom que alguém explicasse os critérios que conduziram a este preciosismo dos duzentos metros.

Esta forma de pretender transmitir a ideia de que temos (agora sim) um governo actuante, consciencioso e vigilante, deitando mão de matérias queridas à esquerda e, frequentemente, carecidas de base científica é absolutamehte exasperante e crivada de vícios de que nunca mais nos libertamos e, mais grave, parecemos gostar. Ou não será verdade que se as culturas transgénicas fossem uma espécie de Frankestein em versão século XXI a medida simples e lógica seria pura e simplesmente proibi-las? Não é ridículo deixar a ideia de que são perigosas mas que o governo teve o cuidado de as manter afastadas duzentos metros das culturas normais (!...), na intransigente defesa dos seus cidadãos? Não é esta medida uma forma de nos fazer idiotas de papel passado a fazer lembrar os tempos de Guterres com a GNR a dar umas bastonadas no pessoal logo seguida de um par de enfermeiros a tratar das equimoses dos agredidos?

Falar de transgénicos exige gente séria, base científica e está muito para além deste carnaval que tem sido usá-la à discrição de organizações políticas que percebem tanto dela como eu de órgãos de igreja. Uma campanha criteriosa e séria trataria de saber primeiro do que se está realmente a passar com os produtos transgénicos, suas vantagens e perigos. E descarta sempre, esta forma idiota de lidar com ela. Sobretudo por parte do governo. Como isto não deve acontecer tão cedo, vamos sobrevivendo resguardados pelo desvelo dos nossos governantes que nos dizem para cultivarmos os tais transgénicos, mas que o devemos fazer a duzentos metros das culturas normais. Ridículo...

NOTA: Ainda no campo da agró-pecuária, fomos visitados por uma comissão europeia que, após um exame em vários pontos do país, afirmou peremptoriamente:

- Portugal não tem um sistema que permita afirmar que comemos peixe fresco e carne importados com segurança.

O Director Geral de Veterinária, entrevistado sobre esta evidência, afirmou "...que não era bem assim, sabe que há algumas deficiências e tal, mas que a conclusão da comissão deve ser um exagero, coisital, que estamos a tomar medidas, que estamos a finalizar um conjunto de normas de procedimento..."

Enfim, o costume. Estou muito mais tranquilo. Já como carne e peixe há um ror de anos mas, finalmente, estamos a elaborar um conjunto de normas de procedimento de segurança. Até lá, um bifito manhoso ou um peixito que já conheceu dias melhores não me devem fazer mal por aí além. Nada que um kompensan não resolva. Até porque as normas de procedimento estão quase prontas. Disse o director Geral de Veterinária.

10 Comments:

At 10:33 da manhã, Blogger Guarda-factos disse...

Caro Espumante,

A questão dos transgénicos, como quase todas outras coisas, é económica (o tal do proteccionismo). Como clone laboratorial geneticamente alterado, muito mais resistente, altera o ecossistema envolvente na medida em que não sustenta a mosca-branca, o míldio ou a lagarta-não-sei-quê. p.e. Por consequência, chega ao mercado a preços mais baixos, o que é uma chatice para qualquer país europeu onde neste campo as únicas experiências cientificas feitas ficam-se pelas volumosas tentativas em demonstrar que 'aquilo' faz muito mal à saúde, causa o cancro ou até podemos ficar verdes (até agora em vão, pelo menos comigo, pois!) :)
Quanto aos 200 mts deve ser para ficar 'nito na foto e compensar o 'póssamos' um dia morrer...

Bom, mas tenho a ligeiríssima sensação que estou a 'ensinar' (note os comas) a missa ao vigário, salvo 'seija'... :))

Abraço

 
At 2:10 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Caro JoãoG
"Prontes", lá vou dar uma de engenheiro :)
Só uns pequenos comentários ao seu, já que, no essencial, parece estarmos de acordo.
1) Um produto geneticamente modificado não é necessariamente um clone laboratorial. Um exemplo muito simples - Uma variedade de milho a que tenha sido inoculado um gene de outra variedade que seja resistente a uma determinada molécula, o glifosato por exemplo. O que resulta? resulta um "milho" que pode ser pulverizado com o tal glifosato e não morre, ao contrário do que acontece às infestantes gramíneas (momocotiledóneas) que competem com os elementos nutritivos. Curto e grosso: - O milho, sendo uma gramínea, não morre com um produto que mata gramíneas. Este é um exemplo real e, como facilmente pode calcular, esta situação não vai bulir MAIS com o ecosistema do que já se bulia antes, quando já se matavam as gramíneas infestantes. No caso dos insecticidas ( a tal mosca branca, "lagarta não sabe de quê", etc, a coisa não se passa exactamente assim, como facilmente se percebe. Este campo é mais sensível mas basta pensar um pouquinho para se peerceber que um pé de milho resistente (hummm, a mosca branca e a largarta não sei de quê, não atacam o milho...) :))por exemplo, a broca do colmo, não vai alterar ecossistema nenhum. Além de que matar brocas do colmo pressupõe que as brocas existem só quando plantamos milho - se não plantarmos milho não há brocas do colmo e... voilá, quando muito destruiríamos o ecossistema já "alterado" pela simples introdução da cultura do milho. Não sei se passei bem a ideia, mas julgo que o João percebe.
Há mil coisas a dizer sobre produtos geneticamente modificados. Eu não sou sequer especialista na matéria... mas o conteúdo do meu post ia apenas no sentido de que a introdução de produtos transgénicos tem, como o João disse, objectivos económicos. Mas apenas por aumentos de produção e melhoria de qualidade das colheitas e não porque se possa introduzir produtos mais baratos no mercado. Isto afasta, portanto, a ideia de proteccionismo. O que se pretende é aumentar produções unitárias, melhorar qualidade de colheitas através da venda de variedades de plantas previamente modificadas. O que é um pouco diferente. Não sendo bem a mesma coisa, posso dizer-lhe que uma produção de 2 toneladas de grão de milho por hectare era, até há pouco tempo, uma produção normal. Com o evento do cruzamento de variedades (híbridação simples -biparentais- e hibridação trilinear)as produções de 10, 11 e 12 toneladas por hectare são vulgares. Os milhos híbridos estão no mercado há pelo menos 2 décadas e, em Portugal, cerca de 90% das áres de milho produzem milho híbrido.
Vou ficar por aqui, que já devo estar a chatear :)))
Eu insurjo-me apenas contra a falta de consistência destas "bandeiras" de contestação,normalmente empunhadas por quem percebe zero do assunto e a forma politicamente correcta como o governo (vários governos) actuam. No fundo sabem que o desenvolvimento tecnológico e científico é desejável, mas há que contentar o rebanho e parir medidas como esta dos 200 metros...
Desculpe lá o arrazoado e um abraço :))

 
At 3:33 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

JoãoG
Com tanta técnica e tema tão profundo (!...) :) passou-me aquela sua subtil passagem "...ou até podemos ficar verdes (até agora em vão, pelo menos comigo, pois!...".
Só para dizer que nunca "ficamos" verdes. Somos ou nâo somos. É um estado de alma. Estado de alma que, ao que me apercebo, não se usa aí pelo GF. Mas não se pode ser perfeito. E os "guardadores" não são excepção...
Saudações (ia a dizer leoninas , mas contive-me...)trangenicamente não modificadas e um bom long week end :)

 
At 5:17 da tarde, Blogger Guarda-factos disse...

Eu não disse que estava a 'ensinar a missa ao vigário'...? :)

Caro Espumante, todos os dias aprendemos coisas, ou pelo menos dizemos isso, mas hoje aprendi mesmo consigo e só posso estar grato pela sua pachorra.

Há 20-25 anos travava-se aqui em Portugal uma luta pela comestibilidade dos produtos extraídos da soja (óleo, farinha, lecitina, etc). Não estavam em causa as sementes transgénicas, mas tão-só a relevância do seu valor nutritivo... ou seja, estavam em causa interesses económicos e aqui, por acaso, o preço tinha tudo a ver.
Mas enfim, enologia também é um bom tema :) e 75% de sirah com 25% de touriga nacional pode fazer toda a diferença: eis como estes temas são emocionantes, principalmente quando se passa do laboratório à mesa :)

Um abraço e, mais uma vez grato, pela sua disponibilidade.

 
At 10:07 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

JoãoG
Tanto quanto julgo saber não há sustentação científica quanto à alteração orgânica de produtos geneticamente modificados. No caso da soja, penso saber que não h´a diferença no teor de proteína entra "sojas", nem de hidratos de carbono. Nem mesmo de aminoácidos... a questão principal é a de se saber se haveria lugar ao aparecimento de novos compostos orgânicos e, eventualmente, cancerígenos. Mas não me alongo mais não vá eu começa para aqui a dizer asneiras que este não é o meu campo de trabalho.
Um abraço

 
At 10:11 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Incompetente
De fez em quando temos de entrar numa snobeira destas não vá pensar-se que somos alguns incompetentes :))
Quanto ao "trans", além de transgredir, estou certo que conhece o transpirar (que é quando nos piramos de uma pessoa para outra),transmitir (que pode ser assim uma espécie de sitemeter geneticamente modificado) e transportar (bater a porta e a porta fazer "trans"). Ah... e há a Transtejo, claro, mas isso já está fora do contexto.
Um abraço :)

 
At 10:36 da tarde, Blogger Madalena disse...

Meu Deus, vocês sabem tanto!!!
Olha, Espumante, a tua caixa de comentários demora muito a abrir. Se calhar é transgénica ou sofreu danos causados pelos trangénicos colocados a uma distância inferior à preconizada na lei.
Eu não acho nada e nem sequer posso discordar de ti! E tu és daquelas pessoas "contra" quem se discorda "bem", sem receios de que a amizade saia magoada, porque trabalho é trabalho, conhaque é conhaque e Espumante é Espumante.
Fica apenas o tal beijinho sem "míldio" ...
Eu só "acho" que perante a natureza me devo vergar sempre com respeito.
Se não há machado que corte a raiz ao pensamento, também não há lei que supere a lei da natureza!

 
At 10:56 da tarde, Blogger Nelson Reprezas disse...

Madalena
A Natureza é dinâmica e não estática. E dessa dinâmica faz parte o homem que ao mesmo tempo que precisa de preservar os ecossistemas (porque deles, em última análise, depende)não pode pôr de parte a sua própria sobrevivência. Deve-se aos avanços da tecnologia e da ciência o facto tão simples como o de não termos (todos) morrido á fome, por força da explosão demográfica que se verificou sobretudo a partir da segunda metade do século XX. Se alguém me puder ou souber explicar como é que se alimenta uma população mundial de cerca de...6 mil milhões de pessoas, não é?...à base de produtos biológicos eu ficarei para semre atento, venerador e obrigado!
Quanto à dificuldade de abertura da minha caixa de comentários é para me vingar da tua... que cada vez que clico nos comments o blog desaparece... vanishes... up in smoke... até eu perceber que fugiu para a cave e, então, à segunda clicadela, a caixa de comentários lá abre, pachorrenta e sobranceiramente assim com um ar de quem diz: - Vá... bota lá o conetáriozinho, mas despacha-te.
:)))))
Beijinho

 
At 3:24 da tarde, Blogger Madalena disse...

Convencida! O problema é que o produto dito natural ( e aqui levanta-se outro problema que é o da fiscalização honesta) vai ser acessível aos mais poderosos. É sempre a mesma coisa! Os pobres ficarão com os transgénicos e sem fome... É a vida. Disso, nem eu nem tu temos culpa!
Beijinhos e bom jogo logo à noite!

 
At 12:03 da manhã, Blogger Madalena disse...

Desta vez o meu desejo de boa sorte não deu sorte...
Se calhar foi por os meus leõezinhos terem faltado!!!
O Leão Pai vinha muito zangado com um penalty ou lá o que era!
beijinhos à mesma!

 

Enviar um comentário

<< Home